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Daniela Costa de Amares e as doenças congénitas em bebés

Daniela Costa é natural de Ferreiros, em Amares e fez todo o seu percurso académico nas escolas do concelho. Aluna de mestrado da UMinho na área da Genética Molecular, Daniela viu, recentemente, um artigo, escrito com outros colegas, ser publicado numa revista da especialidade.

Enquanto pesquisa e analisa dados para a tese, vai passando pelo laboratório da Escola da Medicina, onde está inserida num grupo de investigação sobre doenças congénitas em recém-nascidos, nomeadamente, no pulmão.

O doutoramento é um objetivo real, mas que está dependente de apoio estatal. Até lá, dedica-se nos seus tempos livres, entre outras coisas, a ser animadora no Centro Académico de Braga. A entrevista contou com a presença da sua orientadora Rute Moura.

Conta-me um bocadinho do teu percurso…
Estudei na escola, em Amares, terei o curso de ciências e tecnologias porque era o mais abrangente. Eu, desde pequenina, que gosto de ciência e sempre pensei seguir um percurso mais nesta área e, então, optei por esse porque me abria as portas para aquilo que eu quisesse. No 12º ano, candidatei-me para vários cursos na área da Biologia e da Química e acabei por entrar em Braga, em Bioquímica.

Mas a Bioquímica foi sempre uma opção?
Sim, foi. Os cursos a que me candidatei foi Bioquímica, especificamente, para o Porto, para Trás-os-Montes e tive a sorte de entrar em Braga.

E Bioquímica porquê?
Porque conjugava um bocadinho de tudo aquilo que eu gostava. Gostava tanto de Biologia como de Química, e achei que era um curso mais abrangente do que escolher, por exemplo, Biologia Aplicada que é mais baseada só na Biologia. Assim, fiquei com uma ideia mais geral de toda esta área.

Houve, entretanto, algum arrependimento na escolha?
Não, nada. Houve coisas mais difíceis de fazer, mas faz-se. Não me arrependo da Bioquímica, gostei mais do Biologia do que da Química, mas a Química deu-me bases para saber coisas que, se calhar, um aluno de biologia não sabe.

Quando acabaste o secundário sentias-te preparada para aquilo que encontraste no curso de Bioquímica?
Não, nada preparada. Agora sei que há um processo de acompanhamento dos alunos a nível vocacional, mas, na minha altura, tive uma sessão com uma psicóloga que disse ‘escolham o que vocês quiserem’. Não houve um processo de acompanhamento e o que se sabia era muito por pesquisas em sites das universidades. É uma realidade completamente diferente.

E em termos de conhecimento, há luzes não há luzes?
Há um bocadinho de luzes, mas é muito diferente. É um nível avançado de ensino, temos que estar preparados para aprender muito mais do que aquilo que já sabemos e senti, alguma dificuldade, no primeiro semestre, ao adaptar-me ao ritmo de estudo porque eram muitas matérias para estudar numa semana.

Deveria haver uma maior carga de estudo no final do secundário?
Carga de estudo não digo porque, para os exames finais, há uma preparação enorme. Eu tive experiências com amigos meus que chegaram à Universidade não gostaram do curso, mudaram, voltaram a mudar porque não gostavam. Acho que é preciso dar a conhecer o que se faz, tentar ajudar o aluno a perceber aquilo que gostaria de fazer. No meu caso, poderia ter ido para Bioquímica como para Ciências Farmacêuticas, como para Biologia Aplicada, são tudo áreas muito próximas, mas com conhecimentos diferentes.

Nesse percurso, descobriste alguma área para a qual não estavas tão desperta?
A área da Biologia do Desenvolvimento, onde estou agora a trabalhar. Sempre pensei que gostava muito de trabalhar num laboratório em áreas como o cancro. Durante um workshop, na licenciatura, conheci a professora Rute Moura e fiquei interessada por esta área.

O que é a Biologia do Desenvolvimento?
É o estudo de todos os processos por detrás de todo o desenvolvimento de um embrião humano, por exemplo. Tudo o que acontece desde a fecundação até ao nascimento. E depois há investigação mais específica, no grupo de trabalho onde estou inserida estudamos mais a área pulmonar, mas podemos estudar qualquer outro órgão.

Como está a ser a experiência?
Muito boa. É uma área pelo qual fiquei logo fascinada. Estou a fazer o mestrado em Genética Molecular, que está ligado à Escola de Ciências. Há a possibilidade de se fazer a tese de mestrado num instituto diferente. Portanto, o mestrado é da escola de ciências e a tese de mestrado está a ser realizada no Instituto de Investigação em Ciências da Vida e da Saúde (ICVS) mas vai ser defendida ma Escola de Ciências.

Como é um dia de trabalho no laboratório?
Todos os dias são diferentes. Depende muito do que tivermos planeado para fazer. Nesta altura, ainda não estou o tempo todo no laboratório, estamos no início e a otimizar vários processos. Portanto, não estou das 09h00 às 18h00 com coisas para fazer, mas eventualmente, no futuro, podemos chegar a este ponto.

Recentemente, teve, juntamente com alguns colegas, uma publicação numa revista da especialidade, como surgiu essa oportunidade?
Foi um artigo de revisão que surgiu por convite de uma revista e basicamente pesquisar tudo o que já foi escrito sobre esse tema fazendo um resumo elaborado de tudo o que já existe.

E que tema foi esse?
O tema era sobre desenvolvimento pulmonar e malformações congénitas pulmonares que é a área onde estou agora inserida.

O teu objetivo é estar o tempo todo no laboratório?
Sim, é. Gostava muito de fazer carreira nesta área. É difícil, mas é o meu objetivo.

Quando não estás no laboratório como é o teu tempo?
Neste momento, não tenho aulas porque estou no último ano de mestrado a preparar a tese. Fora do laboratório, passa muito por tratar os dados daquilo que fiz cá, começar a trabalhar, a escrever e a fazer pesquisas para a tese, e claro tenho os meus tempos livres.

Mas que tempos livres são esses, ligados à Biologia, fora da Biologia?
Depende. Já cheguei a participar em iniciativas da Universidade para ajudar alunos do secundário a conhecer a escola de Ciências e também de Medicina. Estou associada ao Centro Académico de Braga, onde sou animadora, e tenho a minha cabeça ocupada com a preparação e a logística do espaço e das atividades. Também saio com os amigos, passear, e estar em casa, sossegadinha, sem pensar em nada.

Gostavas de fazer um doutoramento?
Está nos planos, mas vamos ver…

Professora Rute, qual é a importância de alunos como a Daniela para o desenvolvimento da investigação feita na Universidade?
A Daniela começou o percurso dela connosco no projeto de licenciatura como aluno de Bioquímica, depois mostrou interesse em continuar a trabalhar nesta área e acabou por estar um ano connosco sem estar inscrita em mestrado. Depois entrou no mestrado e, para nós, é essencial porque os projetos de Mestrado são essenciais para avançar com os projetos de investigação. Uma pessoa sozinha consegue avançar, mas de uma forma muito lenta. Os projetos de licenciatura são muito curtinhos, é mesmo só para dar uma ideia daquilo que fazemos no laboratório e atrair os alunos. Nos mestrados, que são um período de um ano, já se consegue fazer um trabalho com cabeça, tronco e membros. O doutoramento, são quatro anos, é uma história mais complexa. Agora, não há dúvida que os alunos de mestrado e doutoramento são a força motriz dos laboratórios de investigação. É importante perceber que eles não trabalham para nós, eles trabalham connosco. Uma boa maneira de fazer funcionar um grupo de investigação, é fazer sentir que estamos todos a trabalhar para o mesmo, que neste caso, é tentar resolver uma questão.

O artigo de revisão é importante?
No caso do artigo de revisão, eu poderia ter escrito sozinha, mas não era esse o objetivo. Os artigos são importantes para os alunos que estão a trabalhar no laboratório. Foi uma boa oportunidade para dividir trabalho e é bom para o currículo não só da Daniela, mas de todos aqueles que contribuíram. Acaba por ser uma maneira de mostrarmos aquilo que fazemos e irmos melhorando o currículo. Se a ideia é a Daniela concorrer a uma bolsa de Doutoramento, o artigo valoriza bastante o currículo.

A dificuldade seguinte será conseguir uma bolsa de doutoramento?
Sim. A fonte de financiamento é a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e nos últimos anos, tem havido uma média de 1300/1400 bolsas por ano a nível nacional. No processo de submissão, seleciona-se a área que mais se aproxima ao tópico de estudo, e depois é ter um bom currículo e um projeto ganhador, mas não há bolsas para todos.

Portanto, mesmo estando inserida num grupo de investigação a Daniela concorre sozinha
É a Daniela individualmente, mas no processo de candidatura é avaliado o mérito do candidato, o projeto em si, o perfil dos orientadores e a instituição de acolhimento. O que tem mais peso nesta candidatura é, sem dúvida, o currículo do candidato. Claro que pode ter um currículo excelente e um projeto fraco, mas o ideal é uma combinação das três coisas. Convém esclarecer que ninguém está obrigado terminando o mestrado a prosseguir para doutoramento. Um projeto de doutoramento tem mais margem para se fazer coisas diferentes e diferenciadoras.

Esta é uma área que ainda se pode expandir, crescer?
Sem dúvida. Felizmente, as doenças congénitas pulmonares não são muito frequentes, mas a taxa de mortalidade associada é elevada. Num mundo que está a envelhecer, as áreas relacionadas com envelhecimento e doenças crónicas são extremamente importantes. O financiamento está muito direcionado para doenças metabólicas, cardiovasculares e neuro degenerativas. No entanto, não convém esquecer que o ocorre durante o período embrionário condiciona a saúde do futuro adulto. Por um lado, há problemas de saúde no adulto que estão relacionados com eventos que ocorrem durante o início do desenvolvimento. Por outro lado, os eventos que ocorrem durante o desenvolvimento estão muitas vezes desregulados no caso de doença e a sua compreensão ajuda a entender melhor os mecanismos de doença.

Daniela se não houver oportunidade de fazer o doutoramento, qual é o futuro?
Boa pergunta! Tentar arranjar trabalho e se não for nesta área será noutra. É desenrascar. Gostava que fosse ligado à área da Biologia. A prioridade, caso não consiga entrar no doutoramento, é tentar encontrar um emprego nesta área que aceitem alunos com o mestrado.

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