Manuela Barreto NunesOPINIÃO

Ler em tempo de guerra

De há um mês para cá, a nossa vida deixou de ser condicionada pelas notícias da pandemia e foi invadida pela guerra. Não que as guerras alguma vez tenham desaparecido da Terra, mas desde a II Guerra Mundial que a Europa não enfrentava uma invasão de um país por outro e, com excepção dos confrontos entre os países que formavam a antiga Jugoslávia, a paz, nesta região privilegiada do globo, parecia duradoura.

Por entre os movimentos de solidariedade, a inquietação e a preocupação que se tornaram manifestos no dia-a-dia dos cidadãos, surgem também a curiosidade e o interesse pelas questões da política internacional, pela história e cultura do país invadido e do país invasor.

“Prisioneiros da geografia”, de Tim Marsahll, é um livro que pode ajudar a entender porque é que há países que têm necessidades permanentes de expansão e porque é que muitos conflitos bélicos têm origem nos condicionamentos oferecidos por cadeias de montanhas, vias fluviais, acessos marítimos. É claro que nada disto explica a psicopatia de autocratas como Putin, mas o conhecimento da geo-política é útil para uma análise racional dos acontecimentos que vivemos.

Para conhecer a cultura de um país, nada melhor do que a literatura. Até os leitores mais assíduos podem pensar que desconhecem autores ucranianos, mas um olhar mais atento revela que, da Ucrânia, sabemos talvez mais do que imaginamos. Comecemos pela detentora do Prémio Nobel de 2015, Svetlana Alexijevich, nascida na Ucrânia em 1948, e autora de narrativas que, a várias vozes, contam histórias de guerra e desenham um perfil dos homens e das mulheres sob os regimes soviético e pós-soviético. “A guerra não tem rosto de mulher”, de 1983, é um dos livros que pode encontrar traduzido para português.

Outros autores, que hoje conhecemos como russos, americanos, ingleses ou até brasileiros, nasceram no território que constitui a nação Ucraniana: Isaac Babel, Joseph Roth, Nicolau Gogol, conhecido como um dos pais da literatura russa, Mikhail Bulgakov e até Clarice Lispector, não só nasceram na Ucrânia como escreveram sobre temas políticos que agora ganham nova relevância. Vale a pena mergulhar na leitura destes grandes escritores, que talvez nos não tragam consolo, mas certamente trarão entendimento.

 

Manuela Barreto Nunes [Bibliotecária]

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